Andávamos por um caminho ao longo de um capinzal, que o vento da manhã ondulava a perder de vista. Íamos a favor do vento que nos levava para a frente, sempre e sempre para a frente.
- Vamos avoar naquela água? - propôs Lili.
- Como?! Repete isso.
Não repetiu. Essas coisas não se repetem. A verdade é que fiquei atônito e agradecido. Era que, naquele tempo, Lili tinha cinco anos e, em matéria de cultura poética, apenas conhecia, ao que eu soubesse, certo hino que cantavam no Jardim da Infância e onde apareciam, creio que em estribilho, as harmoniosas mas inesperadas sílabas do nome do Dr. Celeste Gobato.
Ora, apenas com essa mostra da poesia antiga e desconhecendo completamente a moderna, Lili acabava de demonstrar, com a insuspeita inocência de seu exemplo, o quanto a nova poética é por si natural.
Como uma pequenina Mademoiselle Jourdam de saia florida e franjinha esvoaçante, estava fazendo poesia sem querer. E poesia moderna, dessa que gente grande teimava em não aceitar, devido às limitações da lógica adulta.
Havia ali uma interpenetração das imagens - não sucessivas, não ligadas por "assim como" - e sem menção prévia do objeto que as fizera brotar. Puro Mallarmé, mas espontâneo, sem as suas custosas elaborações.
Um poeta lógico (!) começaria assim:
"Ondula o verde canavial ao vento"
("capinzal" ele não diria, não, por mal agradecidos escrúpulos cavalares.)
"Ondula o verde canavial ao vento,
Tal como, ao vento, ondula, verde, o mar."
E assim por diante. Tudo bem claro, ritmado, lógico.
Mas onde a magia daquele teu poeminho de um só verso, Lili?
Mario Quintana (Caderno H, p 348)
Imagem: www.deviantart.com
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ResponderExcluirLu,
saudades, menina querida!
Respondi teu email, você viu?
Pensei na possibilidade de ter ido para o spam, portanto, se não viu a resposta, procura por lá.
Lindo! Lindo! Lindo!
Sempre surpreendendo com as escolhas que fazes do Quintana.
Beijos de saudades muitas.
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